quinta-feira, 2 de junho de 2011

Educação Infantil não é Lugar de Preparação para a Alfabetização

           Aprender uma língua não é somente aprender as palavras, mas também os seus significados culturais, e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio sociocultural entendem, interpretam e representam a realidade. (BRASIL, 1998, p. 115)

          A Educação Infantil sofreu inúmeras mudanças nos últimos anos. Uma delas adveio da inserção da criança de 06 anos no Ensino Fundamental (EF). Porém mesmo antes da lei antecipar a entrada no EF muito se houvia falar em como a leitura e escrita deveriam ser trabalhadas nas salas de pré-escola; se este era ou não momento para se Alfabetizar.
          Muitos foram os embates ideológicos e de acordo com a concepção pedagógica adotada pela escola o entendimento divergia. Haviam educadores que contestavam a função da pré-escola como preparação para o ensino fundamental e outros se rendiam a antecipação de práticas já tradicionais do ensino fundamental para este momento.
          Contudo, nem sempre as práticas estavam alicercadas nos estudos a respeito do desenvolvimento infantil. Em alguns casos a justificativa para tal postura se pautada na cobrança dos pais que acreditavam que seus filhos só aprendem se os cadernos estiverem cheios de cópias - mesmo que os pequeninos não saibam o quê e para quê estão copiando - ou na falta de formação dos educadores para lidar com tal idade.
          Esses dois pontos convergem para um mesmo, uma vez que se o professor for bem formado ele saberá responder aos pais qual é função da pré-escola e o papel dela, assim como direcionará as atividades para o desenvolvimento da criança, em consonância com a fase que ela se encontra, e não se deixará ser pressionado a executar atividades que em nada contribue para a formação do seu pequeno aluno.
          A formação específica, e em nível superior, para atuar nesta etapa é tão necessária quanto para qualquer outra e o professor precisa refletir sobre o como a criança pequena aprende, quais são os recursos e meios que facilitam tal aprendizado e quais são as atividades que lhe possibilitaram atuar no mundo letrado.
          Preparar o aluno da escola infantil para sua entrada na alfabetização, não é função da pré-escola e tão pouco deve ser objetivo desta. Ler e escrever de forma convencional é função do Ensino Fundamental e exige condições, metodologia e ambiente adequado para isso.
          Contudo, ressalto: em nenhum momento quis dizer que a leitura e escrita não devam fazer-se presente nas creches ou pré-escolas, muito pelo contrário, desde o berçário é preciso que haja atividades que propiciam o contato com a linguagem e que estas façam parte das atividades permanentes.
Por muito tempo prevaleceu, nos meios educacionais, a idéia de que o professor teria de planejar, diariamente, novas atividades, não sendo necessário estabelecer uma relação e continuidade entre elas. No entanto, a aprendizagem pressupõe uma combinação entre atividades inéditas e outras que se repetem. Dessa forma, a organização dos conteúdos de Linguagem Oral e Escrita deve se subordinar a critérios que possibilitem, ao mesmo tempo, a continuidade em relação às propostas didáticas e ao trabalho desenvolvido nas diferentes faixas etárias, e a diversidade de situações didáticas em um nível crescente de desafios. (BRASIL, 1998, p. 132)
          O que muda é o modo como a linguagem oral e escrita deve ser trabalhada na Educação Infantil. "A oralidade, a leitura e a escrita devem ser trabalhadas de forma integrada e complementar, potencializando-se os diferentes aspectos que cada uma dessas linguagens solicita das crianças [...]." (BRASIL, 1998, p. 132). Nesta etapa não se deve priorizar as atividades de prontidão para leitura ou escrita, de antecipação das inúmeras atividades específicas da alfabetização, nem tão pouco ser um momento de preparação para no futuro a criança aprenda a escrever. O que se espera é um trabalho que insira o aluno nas práticas sociais do uso da linguagem por meio de experiências significativas.
A educação infantil, ao promover experiências significativas de aprendizagem da língua, por meio de um trabalho com a linguagem oral e escrita, se constitui em um dos espaços de ampliação das capacidades de comunicação e expressão e de acesso ao mundo letrado pelas crianças. Essa ampliação está relacionada ao desenvolvimento gradativo das capacidades associadas às quatro competências lingüísticas básicas: falar, escutar, ler e escrever. (BRASIL, 1998, p. 116)
          Por ser a Educação Infantil uma etapa específica da Educação Básica, com princípios e características própria é preciso que as práticas estejam de acordo com os seus objetivos. Para isso é importante que o professor valorize a cultura oral e escrita na escola, promova momentos de construção de conhecimentos e permita que seus aluno expressem suas hipóteses a respeito da linguagem.
Considerando-se que o contato com o maior número possível de situações comunicativas e expressivas resulta no desenvolvimento das capacidades lingüísticas das crianças, uma das tarefas da educação infantil é ampliar, integrar e ser continente da fala das crianças em contextos comunicativos para que ela se torne competente como falante. Isso significa que o professor deve ampliar as condições da criança de manter-se no próprio texto falado. Para tanto, deve escutar a fala da criança, deixando-se envolver por ela, ressignificando-a e resgatando-a sempre que necessário. (BRASIL, 1998, p. 133)

          No vídeo A Linguagem Escrita e a Crianças:  superando mitos na Educação Infantil, Maria Zilda da Cunha fala da importância de se ensinar a linguagem em consonância com os usos sociais, promover situações de aprendizagens e inserir os alunos num ambiente letrado, a fim de que ela possa recolher instrumentais para se comunicar com facilidade e se torne uma criança com um nível de letramento satisfatório. Ao colocar a criança em contato com a escrita
Ela versa num ambiente letrado, quer dizer ela esta efetiviamente numa atividade de linguagem. Imersa nesse ambiente, interagindo com esse ambiente, ela passa a refletir sobre alguns recursos e as propriedades desse sistema de representação que é a escrita, dessa linguagem, desses elementos que são usados por esta linguagem que escreve, e fazer uso desses elementos a medida de sua possibilidade e a medida que ela esta colocada. (CUNHA, 2011).
          As pré-escolas são locais de construção de conhecimentos e não de treino ortográfico ou cópia de textos prontos. Nestas a leitura e escrita deverá contemplar sua função social, com finalidade e sentido o mais próximo possível da realidade. As instituições infantis deve tornar-se em ambientes de letramento. O trabalho, então, deverá visar a produção de texto, com maior similaridade possível com as práticas e usos sociais. E,  permitir que a criança crie hipótese sobre as relações de registro e a dimesão simbólica da linguagem escrita, segundo Cunha (2011).
     
       A cultura da infância precisa ser (re)apresentada aos educadores infantis e
[...] Devemos com urgência “descontaminar” a escola da infância dos procedimentos típicos do ensino fundamental e “contaminar” o ensino fundamental com procedimentos – como as atividades de expressão – que devemos ter como tópicos da escola infantil e que, para o bom desenvolvimento da inteligência e da personalidade das crianças, devem estar presentes também nas séries iniciais do ensino fundamental (MELLO, 2005, p. 39).
          Hoje, sabendo que a criança terá 03 anos para participar de um processo efetivo de alfabetização e que na Educação Infantil ela ficará menos tempo é necessário observar que tipo de atividade esta sendo proposto. Haja visto que esta deve propiciar o contato da criança com a leitura e escrita, mas não é meta desta ensinar a criança a ler e escrever (CUNHA, 2011). A linguagem escrita deve ser vista como um processo dinâmico e ativo, dada a sua importância enquanto prática social e elemento de comunicação.
O erro [esta] em querer iniciar a aprendizagem pelos processos de repetição e deciframento de letras, sem inseri-los em um contexto em que ler e escrever tivessem significado para os alunos.
O importante agora é aprender a ler com palavras, frases e textos que sejam significativos para cada grupo de crianças e, por isso, vemos cada vez menos métodos baseados apenas em cartilhas e listas pré-fabricadas de frases. De forma bastante sensata, busca-se desenvolver não apenas a competência para ler e escrever, mas também o prazer em fazê-lo. (E.EDUCACIONAL, 2011)
          "Dentre as atividades humanas, a atividade de linguagem funciona como uma interface entre o sujeito e o meio e responde a um motivo geral de representação-comunicação." (SCHNEUWLY; DOLZ, 1999, p. 11). Deste modo, cantigas de roda, brincadeiras cantadas e faladas, histórias, poesias, músicas e diferentes tipos e gêneros textuais devem fazer parte da Educação Infantil, para que o ensino-aprendizagem da linguagem aconteça de forma lúdica e significativa.
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Curiosidades:
Como se aprende a ler e escrever?

         Pode ser uma aprendizagem de natureza perceptual e motora ou de natureza conceitual. O ensino,
          no primeiro caso, pode estar baseado no reconhecimento e na cópia de letras, sílabas e palavras;
          no segundo, no planejamento intencional de práticas sociais mediadas pela escrita, para que as crianças delas participem e recebam informações contextualizadas. (SCARPA, 2006).
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Tema da Palestra: O Papel da Escrita na Formação do Leitor
Palestrante: Delia Lerner
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LETRAMENTO: tem a ver com uma questão mais ampla, com esta dimensão mais macro do sistema de representação da escrita e tem a ver com todos os componentes semióticos que perpassam o sistema de representação, são as atitudes letradas.
ALFABETIZAÇÃO: O processo de alfabetização é a percepção e a apropriação de todo um sistema de marcas que são usadas para o registro de uma linguagem que se escreve. E esse processo, ele também não para aqui. (CUNHA, 2011)

O que é Letramento?

Para o exercício da cidadania plena, além de aprender a ler e a escrever, o indivíduo precisa apropriar-se da função social da leitura e da escrita, isto é, deve ser capaz de fazer uso dessas duas práticas no dia-a-dia.
(Adriana Maricato e Sônia Jacinto)
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Para saber mais, leia:
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998.http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/alfabetizacao-inicial/alfabetizar-educacao-infantil-pode-424823.shtml>.

SCARPA, Regina. Alfabetizar na Educação Infantil. Pode?. Disponível em:  <<
SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Os gêneros escolares: das práticas de linguagem aos objetos de estudo. Revista Brasileira de Educação. mai, jun, jul, ago. 1991.
TEBET, Gabriela Guarnieri de Campos. A educação infantil contribuindo para a formação de leitores. Disponível em: http://www.moderna.com.br/moderna/didaticos/ei/.

Pequenos grandes autores. Nova Escola. fev. 2007. Fundamentos: 4 a 6 anos. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/4-a-6-anos/pequenos-grandes-autores-419566.shtml.
BRITTO, Luiz Percival Leme IN FARIA, Ana Goulart de, MELLO, Suely Amaral (orgs.). O mundo da escrita no universo da pequena infância. Campinas, SP: Autores Associados, 2005.

MARICATO, Adriana; JACINTO, Sônia. Seminário internacional discute alfabetização e letramento na infância. p. 35-37.  Disponível em: &lthttp://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/rev_crian_39.pdf>.

E.EDUCACIONAL. 2011.  Alfabetização: glossário pedagógico.  Disponível em: <http://www.educacional.com.br/glossariopedagogico/verbete.asp?idPubWiki=9555>.

Para saber mais, veja:
CUNHA, Maria Zilda da. A linguagem escrita e a criança: superando mitos na educação infantil. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=ROlZ1zhLOuA.

Grafismo infantil: leitura e desenvolvimento. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=DPzYg6Zw8W8&feature=relmfu>.

Dicas de atividades:

MORANO, Ana. Pequenos grandes autores. 4 a 6 anos: fundamentos. fev. 2007. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/4-a-6-anos/pequenos-grandes-autores-419566.shtml.

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